Conheça algumas das mulheres que se destacam em áreas de mineração, biotecnologia, robótica e Inteligência Artificial nas Unidades Embrapii

As áreas de inovação ainda são, tradicionalmente, dominadas por homens. Mas esse é um cenário em transformação. Mulheres líderes de grandes centros de pesquisa nacionais provam que não há barreiras para o sucesso. A Embrapii (Empresa Brasileira de Apoio à Inovação Industrial) reuniu histórias de seis pesquisadoras que possuem enredos muito diferentes e uma enorme semelhança: são exemplos dos avanços pela igualdade de gênero na área da inovação.

As pesquisadoras Ligia Mara Gonzaga, Silvia Botelho, Patrícia Toledo, Gabriele Celis, Tamires Pereira e Maria Ligia Macedo trabalham em Unidades Embrapii, centros de pesquisa de excelência espalhados por todo país que desenvolvem soluções em inovação para a indústria nacional. Elas atuam na liderança e/ou desenvolvimento de projetos em áreas como engenharia de minas, mecânica, robótica, inteligência artificial, processamento de biomassa, materiais avançados e biotecnologia.

Confira abaixo os perfis e saiba quem são algumas das mulheres que promovem a inovação brasileira.

Despertar para ciência

A jovem Gabriele Celis começou a trilhar sua carreira científica antes mesmo de ingressar na faculdade.  Curiosa por natureza, ela buscava uma carreira em que a criatividade fosse valorizada e escolheu a biomedicina, focada em atuar em pesquisa. Já são cinco anos de estudo desde que ingressou na faculdade, em 2017. Hoje, aos 24 anos, Gabrielle atua em projetos de inovação na Unidade Embrapii Cqmed e faz mestrado em genética e biologia molecular, estudando os efeitos do uso de associações medicamentosas para o tratamento de leucemia. Uma trajetória de sucesso para a filha de trabalhadores rurais, que nasceu em uma pequena cidade de 15 mil habitantes no interior paulista.

O acesso ao ensino superior ocorreu com bolsa integral via ProUni.  A faculdade, porém, ficava em outro município e, como não era viável se manter naquela cidade, a jovem percorreria 140km diários para estudar, nos ônibus oferecidos pela prefeitura. Durante a graduação, foi estagiária da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp), no Laboratório de Fisiologia Experimental. Lá, teve seu primeiro contato prático com a pesquisa, desempenhando atividades relacionadas à pesquisa pré-clínica in vivo sobre o transtorno do espectro autista.

A passagem pelo laboratório confirmou o interesse pela pesquisa e a despertou para docência.  Logo após a formatura, vislumbrou a oportunidade de atuar como técnica laboratorial no Centro de Química Medicinal (Cqmed/Unicamp), como a porta de entrada para atuar na Academia. Após um ano, foi aprovada no mestrado da mesma instituição.  “Eu não queria trabalhar na rotina hospitalar. Depois do laboratório da faculdade de medicina, passei a querer dar aula, produzir e transmitir conhecimento, de ter troca com alunos”, destaca.

Pela Embrapii, participou do desenvolvimento de uma tecnologia capaz de realizar exames laboratoriais remotos para a detecção de agentes virais de doenças infecciosas, como coronavírus, dengue, zika e chikungunya. A solução combina exames de detecção de RNA viral e inteligência artificial, que conferem mais precisão e rapidez aos diagnósticos.

Apesar do interesse em continuar sua formação e seguir no doutorado, a experiência em atuar com a indústria ampliou os horizontes da pesquisadora para oportunidades que desconhecia existir no país: trabalhar com ciência na iniciativa privada. “Aqui, no Cqmed, com a Embrapii, abriu-se um leque de possibilidades. Há um mercado próspero com as biotechs e vi vários colegas migrando de carreira, saindo da Universidade e indo trabalhar na indústria farmacêutica”, comenta.

Minerando mulheres

Aos 38 anos de idade, a pesquisadora paraibana Ligia Mara Gonzaga é doutora em Engenharia de Processos pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e diretora executiva do Centro de Referência em Tecnologia Mineral (CRTM), do Instituto Federal de Educação do Rio Grande do Norte (IFRN), unidade credenciada pela Embrapii na área de mineração. Para chegar à posição de liderança em um setor majoritariamente dominado por homens, a engenheira de minas enfrentou as mais diversas dificuldades que, juntas, foram responsáveis pela construção de uma trajetória de superação e sucesso.

Ligia nasceu no sertão da Paraíba, na cidade de Sousa. Quando criança, morava em uma casa de barro e vendia balas com a mãe no terminal rodoviário da cidade, onde o pai também trabalhava na limpeza. Na juventude, foi garçonete e vendia água mineral na porta dos ônibus. A formação da pesquisadora se deu inteiramente na rede pública. Cursou Engenharia de Minas, em uma classe com apenas três mulheres. No dia da formatura, foi diagnosticada com síndrome dismielizante, condição que paralisou todo lado esquerdo de seu corpo.

Ainda em tratamento, Ligia se inscreveu para o mestrado na COPPE no Rio de Janeiro e passou. “Foi um período difícil porque tinha de viver numa cidade grande com bolsa de R$ 1,5 mil. Chegava no meio do mês eu só tinha R$ 10”, lembra. Entre 2014 e 2016, trabalhou no Centro de Tecnologia Mineral (CETEM/RJ). Em seguida, foi aprovada no IFRN e começou a dar aulas em cursos técnicos de mineração. Hoje, ela é diretora-executiva do Centro de Referência em Tecnologia Mineral (CRTM) do IRFN. Já a partir de 2017, a equipe da PROPI (Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação do IFRN) iniciou as tentativas para credenciar o CRTM na Embrapii. “Não foi fácil porque é um processo muito rigoroso, eu digo que passamos por três Copas do Mundo, até que, no fim de 2022, conseguimos o credenciamento e nos tornamos uma Unidade Embrapii”, destaca.

O próximo passo na carreira de Ligia é o projeto “Minerando Mulheres”. Ainda em fase inicial de concepção, o programa será desenvolvido dentro da unidade e aplicado na região de Currais Novos, cidade do interior do Rio Grande do Norte. A ideia é levar palestras e atividades educativas para mulheres da localidade, além de capacitação em artesanato. “Queremos levar oportunidades a outras mulheres também, para que possam criar suas próprias trajetórias de sucesso”, conclui Ligia.

Pioneira em robótica e IA

Silvia Botelho, 53 anos, é uma das mulheres de destaque na área de robótica e Inteligência Artificial (IA) no Brasil. Diretora do Centro de Desenvolvimento Tecnológico de Ciência de Dados, Robótica e Automação (iTec), da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), umas das unidades credenciadas pela Embrapii, e diretora de Relações Institucionais da Sociedade Brasileira de Automática, Botelho trabalha com tecnologias de fronteira. Atuou no desenvolvimento de mais de uma centena de produtos e processos, envolvendo plataformas robotizadas e sistemas inteligentes para o setor produtivo. Sua história e desafios enfrentados para se consolidar na área inspira uma gama de estudantes e pesquisadoras a atuarem na área de Tecnologia da Informação e Comunicação (TICs).

A pesquisadora nasceu em uma região com baixíssimo IDH, no município de Rio Grande, interior do Rio Grande do Sul. Desde nova, decidiu pela transformação daquela realidade pelo conhecimento, com o compromisso de também promover o desenvolvimento regional. Para isso, iniciou uma estrada desafiadora a partir da profissão que escolheu: engenharia elétrica. Silvia Botelho foi a única mulher entre os 98 formandos do curso pela UFGRS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), em 1992. O feito se repetiu: foi a única mulher brasileira na França a doutorar em robótica e IA, no início da década de 2000.

Desde então, a pesquisadora entendeu que o maior enfrentamento seria provar a sua capacidade técnica. “O menor quantitativo de mulheres no meio, dificulta a percepção de que a diversidade de gênero pode ser totalmente positiva para o melhor desempenho profissional. Isto gera um preconceito que deve ser vencido logo de início, quando a mulher inicia sua atuação naquele ambiente”, comenta.

Silvia coordenou propostas para a recente Lei de Inovação, incluindo conceitos inovadores, como sandbox para contratações públicas, transferência de conhecimento e tecnologias. Ano passado, a pesquisadora ganhou o prêmio Inventor, concedido pela Petrobrás, por produzir tecnologias disruptivas que estão sendo aplicadas a diferentes situações, como por exemplo, a inspeção de tubulações de energia nos estádios da Copa do Mundo; a soldagem robotizada de painéis metálicos para estruturas offshore; o roteamento de distribuição de energia elétrica com células ativas de ligamento e desligamento; e a transformação digital de databooks.

Além disso, a sua participação no desenvolvimento de tecnologias para o mar habilitou Silvia a ser a representante brasileira do setor marítimo portuário na International Maritime Organization (IMO) para a definição de políticas internacionais para navegação autônoma.

Contudo, comparando a realidade de quando Botelho iniciou sua jornada com a atual, houve avanços importantes que dão às mulheres mais oportunidades de atuação em inovação, seja em empresas ou centros de pesquisa. “A presença de um maior quantitativo de mulheres na área, devido às políticas de inclusão de gênero permitiu, nestes últimos anos, uma maior aceitação das mulheres. Hoje temos mais mulheres ingressando nas carreiras de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEMS, sigla em inglês), mais mulheres em cargos de direção e chefia, e por aí vai”, conclui Silvia Botelho.

 Paradigmas quebrados

Patrícia Toledo é pesquisadora e coordenadora da Unidade Embrapii Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM). Especialista em Inovação, ela faz todo o gerenciamento dos projetos da Unidade, que atua nas áreas de Biotecnologia Industrial, Biotecnologia aplicada à Saúde, Processamento de Biomassa e Materiais Avançados. Quando cursou a Faculdade de Engenharia de Produção de Materiais na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), havia apenas três mulheres em uma turma de mais de 50 alunos.

“A ciência em si ainda é um meio com muita presença masculina. É um desafio, mas, particularmente, nunca vi como barreira para meu crescimento. Pelo contrário, sempre fui movida pelo desejo de superar desafios. Acho que o meu exemplo, como de outras tantas mulheres líderes que trabalham no CNPEM e do meu time que é majoritariamente feminino, pode inspirar jovens mulheres que também desejam atuar na área da ciência e tecnologia”, destaca.

Patrícia Toledo cursou mestrado em Engenharia Mecânica, é especialista em Six Sigma Black Belt, MBA em Gestão Estratégica de Negócios, e é doutora em Política Cientifica e Tecnológica, todos os títulos pela Unicamp. Iniciou a trajetória profissional trabalhando na indústria automotiva. Em seguida, atuou na Agência de Inovação da Unicamp, onde foi uma das responsáveis pelo seu desenvolvimento e uma das primeiras diretoras, e liderou projetos de transferência de tecnologias, parcerias internacionais e o engajamento com o mercado.

Patrícia é também coordenadora do comitê de Bioeconomia Industrial da Rede Embrapii/MCTI de Bioeconomia. Carioca e com atuação profissional na cidade de Campinas (SP), ela encoraja outras mulheres a correrem atrás de seus sonhos.

“Há um movimento global em defesa da importância de um ambiente diverso e no qual as diferentes opiniões são cada vez mais valorizadas. Eu trabalho com inovação e, quando a gente fala nela, falamos em relacionamentos, multidisciplinaridade e quebra de paradigmas, e nada melhor do que a diversidade para gerar esses resultados. Todos os dias eu sou desafiada a ser e pensar diferente. Isso supera qualquer barreira que eu possa ter enfrentado para viver essa experiência”, ressalta.

Educação que transforma

A educação transforma vidas, realiza sonhos e amplia os horizontes. Foi seguindo esse pensamento que Tamires Pereira Alves superou os desafios e começou a trilhar sua trajetória profissional ainda na adolescência.

Aos 16 anos, com aspirações de um futuro promissor e sem grandes certezas de o caminho seguir, passou pelo processo seletivo do curso técnico de mecânica no Instituto Federal da Bahia (IFBA).  A proposta era ter uma formação profissional que garantisse um emprego imediato e qualificado na indústria. 

“Eu não tinha ninguém da minha família que trabalhasse na área. Minha mãe era dona de casa e meu pai comerciário, mas eu gostava de ferramentas e a profissão era valorizada no mercado. No decorrer do tempo, me apaixonei pela área e queria conhecer cada vez mais”, destaca.

Foi assim que decidiu cursar engenharia elétrica. O ambiente sempre foi majoritariamente masculino – das 30 pessoas da turma, apenas eram três mulheres, na faculdade.  “Passei a ter muito mais consciência de gênero já no curso técnico e se ampliou na graduação. É uma situação extremamente desafiadora. É ter, em alguns momentos, a sua capacidade e competência colocadas em dúvida apenas por ser mulher”, enfatiza.

Tamires engravidou na graduação e, junto com os desafios da maternidade, um novo horizonte profissional se abriu. Ela ingressou na equipe de estudantes bolsistas da Unidade Embrapii IFBA e entrou em contato com a área de pesquisa e inovação no Polo de Inovação Salvador. “Foi um processo de muito aprendizado e, com toda certeza me fez uma profissional melhor.  Tive uma visão muito maior e mais completa do que poderia fazer na profissão”.

Ela atuou em dois projetos em parceria com a indústria. Durante a pandemia da covid-19, participou do desenvolvimento de uma torre de esterilização ultravioleta compartimentalizada, que permite a higienização de objetos em larga escala e a eliminação inclusive do coronavírus da superfície.

Foi também umas das responsáveis pelo simulador de paciente para estudo de patologias cardíacas, tecnologia que vai apoiar o ensino de alunos de Medicina.  “Tenho muito orgulho de estar nesse projeto. Ele foi um dos vencedores do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (CNIF) e sua classificação me proporcionou uma viagem à Austrália, onde tive a chance de representar o nosso país. Esse tipo de experiência é uma coisa que nunca poderão tirar de mim. É por isso que gosto tanto do conhecimento”, destacou.

Além do mestrado, ela atua também como pesquisadora no Polo de Camaçari da Ford. Para o futuro, sonha em continuar sua formação acadêmica e viver da pesquisa. “Tenho esperança de que a cultura da inovação chegue com força e que os profissionais com qualificações acadêmicas e experiência em PD&I possam ser valorizados como um profissional de gestão”, finaliza.

Os desafios das conquistas femininas

Pró-reitora de pesquisa e pós-graduação da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Maria Ligia Macedo é a atual diretora da Unidade Embrapii Agrotech – Bioeconomia no Agronegócio. Com 30 anos de atuação no campus de Três Lagoa da UFMS, a pesquisadora bolsista de produtividade (PQ1C) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), começou na iniciação científica ainda durante a graduação de Ciências Biológicas, na Universidade Federal do Ceará, e nunca mais parou.

Seguiu no mestrado buscando explicar o porquê de determinadas plantas serem resistentes à insetos e outras não. Manteve a linha durante o doutorado, pesquisando biomoléculas ativas com potencial biotecnológico.

Obteve reconhecimentos científicos e acadêmicos, como prêmios Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) de Inovação, da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), de Inovação da Academia Brasileira de Farmácia, melhor tese do ano da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).

Em uma rápida entrevista, a veterana na área de pesquisa científica, fala com propriedade sobre os desafios das conquistas femininas. Confira.

Qual a importância de uma mulher estar à frente de um cargo de gestão?

É necessário fazer um histórico da Ciência no mundo até chegar à atualidade para conseguir reconhecer a importância de ter hoje mulheres, pesquisadoras, cientistas, empresárias, inovadoras em cargos de gestão.

Se olharmos algumas dezenas de anos atrás, vamos encontrar projetos de mulheres assinados pelos maridos e colegas masculinos. Pesquisadoras que apareciam como coadjuvante, mas eram elas as próprias agentes. Era um tempo em que as mulheres ficavam escondidas.

Mas a ciência evolui e essas mudanças são acompanhadas pela sociedade. A nossa universidade é parceira das mulheres, porque abre espaço para que sejamos gestoras. Temos uma vice-reitora, quatro pró-reitoras e várias diretoras.

Qual a relevância de dirigir uma Unidade Embrapii?

A gestão é muito representativa para mim e para UFMS, pois sou a primeira mulher a gerir uma Unidade Embrapii no Mato Grosso do Sul. A equipe administrativa da Agrotec-UFMS é composta por cinco mulheres, o que representa 80% da equipe. Dos dez projetos de inovação contratados aqui, oito têm mulheres coordenando a pesquisa.

Enxergo a Embrapii como parceira das mulheres, por buscar talentos e capacidade, independentemente de gênero. É motivo de muito orgulho ser uma das gestoras que estão à frente de uma Unidade Embrapii, junto com outras instituições de ensino e pesquisa que também têm mulheres em cargos de gestão.

Acreditamos que a nossa Unidade seja um marco nessa mudança e colabora para trazer mais equidade entre homens e mulheres. Cabe a nós ajudar esse processo acontecer.

Qual a importância da Unidade Embrapii para você hoje? Quem investe em ciência, em inovação, em tecnologia e em empregador, investe no desenvolvimento e crescimento do país. Para mim, é o que a Embrapii vem fazendo com brilhantismo.

Um projeto Embrapii é capaz de reunir vários setores da sociedade em um mesmo objetivo, sendo um deles a inovação sustentável que atenda os anseios da sociedade. Com a nossa Unidade, geramos bioeconomia dentro de uma cultura sustentável, buscando a partir do nosso Cerrado e Pantanal gerar processos e produtos em toda extensão da sua cadeia.

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